sábado, 9 de julho de 2016

Sobre o dia em que a princesa saiu do castelo e foi ver reino sem a família


 Há tempos minha filha planeja viajar com a turma de escola e dormir fora de casa. Viver esta experiência, era realmente um sonho que ela acalentava com muito coração. Eu tentava convencê-la por vários argumentos, de que ela era muito pequena para isso. Que quando fosse um pouco maior, eu permitiria, sem problemas.

 Para vocês entenderem, na escola dela há saídas de campo para cidades históricas, onde estudantes têm a oportunidade de conhecer lugares e vivenciar situações cotidianas e a própria viagem, sem a presença de sua família.

 Sim, há uma equipe da escola e da empresa que promove as viagens culturais, presente com os grupos o tempo todo.Pois bem, minha filha só foi porque o pai deixou!!! Se dependesse apenas de meu coração materno e protetor, lógico que ela não teria ido. No entanto, me senti impedindo-a de viver importante exercício de independência, caso negasse. E então chegou o dia...

Na verdade, teve todo o preparo para o grande dia... Desde a semana antes, quando tentava aliviar a ansiedade dela, doida por arrumar a mala, escolher o que levaria, inclusive a mala, eu ainda tentava convencê-la a desistir (sempre em vão, diga-se de passagem...). Por ela, para três dias, carregaria suprimentos para trinta (ou noventa...)

Lembrei de amigas blogueiras que viajam com bagagem enxuta e consegui reduzir o conteúdo para o suprimento de quatro ou cinco dias, considerando a idade da pessoa e as possíveis intercorrências às quais criança está suscetível... Difícil convencer uma menina vaidosa a repetir roupa. Difícil convencer menina vaidosa a compor looks práticos e adaptados... Mas foi, vencemos esta etapa.

Então, na véspera da viagem, fizemos nossa checagem final e fomos dormir cedo. Ela foi né... Quem disse que eu consegui? Precisávamos sair de casa ao redor de 05:40, para estar na escola às 06:00, pois o ônibus partiria às 06:30...

Dia 1: O ônibus saiu da escola às 07:15. Recebi a primeira ligação dela às 08:54, onde fizeram a primeira parada.
13:24 - recebi a segunda chamada, quando chegaram no hotel. Estavam organizando as bagagens e indo almoçar por ali mesmo.
19:05 - outra chamada: "mãe, estamos indo jantar, tá tudo bem tá! Te amo!
22:39 - Eu liguei! Falamos rápido pois ela estava já no quarto, exausta e se preparando para dormir... 

Comecei a ficar realmente tensa, por pensar como passaria a noite a minha pequena princesa? Como seria se, do nada ela tivesse um pesadelo, uma dor ou simplesmente um sobressalto e se assustasse? Azar o meu, contentasse em estar longe pois ela estava bem. Estava feliz e se preparando para mais um dia de sua aventura longe de casa. Depois de chorar talvez perto de uns dois litros de lágrimas, me acalmei e fui deitar. Costumo deixar meu telefone no silencioso durante a noite, mas neste dia, não fiz isso. Vai que minha filha ligasse, precisasse falar comigo? 

"avião sem asa, fogueira sem brasa, sou eu, assim sem você..." *
Dia 2
13:42 - Recebi a primeira ligação dela... Acreditem, coisa de um minuto antes da ligação, passei em frente à escola dela e coincidentemente, no rádio começou a tocar uma música que ela gosta e apresentou pra mim. Certo que me deu um aperto e nó no peito, mas disse a mim mesma: eu não vou chorar, e de fato, não chorei...Até atender o telefone. Sabe estas coisas de telepatia, transmissão de pensamento, conexão espiritual? Isso tudo e mais a simbiose mãe-filha.
Foi muito importante escutá-la, e poder mais uma vez dizer o quanto a amo e agradecer por ela pensar em mim...
20:26 - Filha ligou. Surgiu uma situação em que ficou muito desconfortável, desprotegida e necessitada de meu colo. Conversamos, acalmei ela e senti que ficou melhor.
22:42 - Liguei para ver como ela estava e desejar boa noite, fazendo já o link com o terceiro dia - quando então ela retornaria para a casa.

"tô louca pra te ver chegar, tô louca pra te ter nas mãos...Deitar no teu abraço, retomar o pedaço que falta no meu coração..."*
Dia 3
13:15 - Recebi chamada dela! Já tinham almoçado e estavam se preparando para a partida, que seria às 14:00h. 
14:10 - "mãe, estamos no ônibus!"

Então minha sexta-feira ganhou um gás! Fiquei animada, fazendo coisas com meu tempo de forma que em nenhum minuto sequer, parei de lembrar dela e veio como um filme, o misto de todos os sentimentos que experimentei nestes dias em que estivemos longe.

Fui lembrando de momentos felizes e ao mesmo tempo de nossas pequenas desavenças. Pensei nela por tudo o que ela gosta, fala, traz para minha vida. Me dei conta de que meu bebê-menina cresceu. Minha guriazinha queria ver o mundo pelos próprios olhinhos e lá estava. Afastada cerca de quatro horas de distância de mim e ao mesmo tempo tão perto e tão longe... Em alguns momentos pensei que meu peito fosse explodir de tanto que ele se espremeu em mim... Apertado, saudoso, sozinho e ao mesmo tempo satisfeito por estar resistindo bravamente sem me deixar ficar triste. Aliás, não havia espaço para tristeza, nem por questões físicas dentro de um peito comprimido de saudade, nem por razões evidentes de que ela estava de fato muito feliz...

Quando o ônibus chegou e logo em seguida avistei minha filha, fui invadida de todo o turbilhão de saudade que compactei em algum arquivo tipo zip. Então ela veio e pude abraçá-la, sentir o cheirinho dela, pegar no cabelo, colocar ela no meio do meu abraço mais apertado e terno que poderia dar. Choramos as duas, e confessamos uma à outra: estava morrendo de saudade!!!!

Houve mãe que me disse: agora nem é hora de lágrimas! É  para sorrir, e não chorar! Né, Ligia? Mas estas lágrimas eram o desaguar de alívio, do reencontro, da nossa união reintegrada novamente. E ali mesmo ela já vinha contando 23449898989898989 novidades, imagina que uma boquinha era pouca para tanta palavra!

Chegando em casa, preparei o prato predileto dela. Escutei ela dizer que não quer mais saber de viajar sem mim. Que não quer mais sentir tanta fome e saudade como sentiu neste passeio. Faz de conta que acreditei na parte do não querer mais viajar sozinha... E então, mais uma vez nos abraçamos e reforçamos para nós duas o quanto cada uma cresceu nestes dias. Como foi importante vivermos este episódio de vida e dele tirar as melhores aprendizagens. Contei pra ela que crescer dói...Que nós duas havíamos ficado doloridas porque crescemos e com isto, conquistamos amadurecimento, as duas.

Eu disse a ela que não vou impedi-la de sair de novo. Que venci a dor infindável do primeiro dia e me orgulhei de mim mesma, por querer superar algo o qual me parecia impossível. E cá estou, trazendo este relato para que vocês saibam que ao mesmo tempo em que mães são fortes e corajosas e tranquilas para verem sua prole voar sozinha, mães são choronas e não têm esta facilidade de desprendimento - mas superam, tá?! Eu serei sempre a chorona que desaba no primeiro dia, sofre, se ausenta do mundo, faz questão de virar mais enroscada que caracol para dentro de si e tudo isso aí que contei para vocês. Porém, nos dias que seguem, uso este sofrer todo para me fortalecer, me mostrar como sou capaz de respirar e ressurgir bem forte, bem firme e pronta para seguir esta nova eu construída. Com certeza já não sou a mesma que era até há três dias. E minha princesa, agora pode sair do castelo com a maior tranquilidade do planeta, pois sabe ser princesa e com certeza também não é a mesma que deixei entrar naquele ônibus, na quarta-feira passada.






 
 p.s: Meu coração agora está completinho mais uma vez...
* música de Claudinho & Buchecha

 
            

 

 

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